terça-feira, 4 de dezembro de 2012

ANÁLISE PSICOLÓGICA: BATMAN - O CAVALEIRO DAS TREVAS




 

O CAVALEIRO das trevas. Direção: Christopher Nolan, Produção de Christopher Nolan, Charles Roven e Emma Thomas, Roteiro de Jonathan Nolan e Christopher Nolan, baseado em estória de Christopher Nolan e David S. Goyer e nos personagens criados por Bob Kane. EUA: Warner Bros. Pictures, Legendary Pictures, DC Comics e Syncopy, 2008. 2DVDs (152min), son; color.


RESUMO DA HISTÓRIA

            A trama é uma continuação de Batman Begins, mostrando Batman no combate ao crime organizado de Gotham City. Bruce Wayne, milionário e empresário é o portador da identidade secreta do herói. Em sua jornada, ele conta com a ajuda de seu fiel mordomo Alfred Pennyworth, o cientista e presidente das empresas Wayne, Lucius Fox e o tenente James Gordon. A cidade de Gotham começa a sofrer com os crimes praticados por um novo criminoso que começa a ascender no submundo do crime, o Coringa. Rachel Dawes, advogada da promotoria pública, amiga e interesse amoroso de Bruce Wayne, inicia um caso amoroso com o promotor público Harvey Dent. Ambos, juntamente com o tenente Gordon, estão investigando os negócios ilegais dos mafiosos.       

Bruce vê em Harvey um meio de acabar com a criminalidade na cidade, o promotor é um dos poucos homens honestos restantes dentro do exercício da justiça pública. Batman, Gordon, Harvey, apelidado de o cavaleiro branco, e Rachel unem seus esforços no encalço, busca e condenação dos criminosos e começam a obter êxito com as dezenas de sentenças de culpados. Porém, o quarteto da justiça não contava com a associação dos mafiosos com o Coringa. O palhaço do crime planeja e executa mortes; da juíza que condenou os mafiosos, do comissário de polícia e de um inocente civil, inclusive enviando uma fita gravada com o assassinato deste para as redes de televisão.             

No vídeo, o Coringa pede que Batman mostre sua verdadeira identidade. Caso contrário, uma ordem de mortes irá ocorrer pela cidade. Bruce pensa em se entregar, mas acaba sendo impedido pelo fato de Harvey confessar falsamente na frente das câmeras de TV, ser ele o portador da identidade secreta do herói. O promotor é preso, e tem início uma violenta perseguição ao carro policial que transporta Harvey, envolvendo o Coringa no encalço do carro e Batman na busca pelo palhaço do crime. Batman e o tenente Gordon, conseguem deter o Coringa. Gordon é promovido para comissário de polícia. O plano do cavaleiro branco, de atrair o criminoso de mente doentia e prendê-lo, aparentemente obtém êxito, mas só aparentemente. Com a prisão do Coringa, todas as atenções estariam voltadas justamente para esta operação, tornando os cuidados com a segurança de Rachel e Harvey, muito mais precários. Devido ao grande número de policiais corruptos dentro da corporação, o sequestro da advogada e do promotor, planejado pelo palhaço, pôde ser concretizado. Eles são sequestrados e aprisionados em endereços distintos, ambos amarrados em uma cadeira, com tonéis de gasolina e uma bomba em seus respectivos cativeiros. Enquanto isso, o criminoso é interrogado e esbofeteado pelo homem-morcego. O palhaço confessa onde eles estão e alerta Batman de que este terá de escolher ou salvar sua amada Rachel ou salvar o justo promotor, pois o tempo é insuficiente para salvar os dois. Batman salva Harvey, mas os policiais falham no resgate da advogada, ela morre na explosão do prédio.                            

Ao mesmo tempo, na delegacia, o Coringa foge após a explosão de uma bomba que estava alojada no estômago de um detento recém chegado. Batman fica desolado com a morte da amiga e amada, este é consolado e aconselhado pelo mordomo Alfred, Harvey que sofreu uma intensa queimadura em sua face, fica furioso com a morte de sua namorada. Harvey é internado em um hospital e recusa-se a receber enxerto de pele na região profundamente destruída pela queimadura. Na TV, um homem que prestou serviços para as Empresas Wayne, diz conhecer a real identidade secreta do homem morcego. No exato momento da entrevista, o Coringa, por telefone faz um apelo a população de Gotham. A população ou quem quer que seja terá um determinado período de tempo para assassinar o delator, antes que ele conte a identidade secreta de Batman. Caso o assassinato não seja realizado dentro do período determinado pelo palhaço criminoso, este explodirá um hospital. Inicia-se uma situação caótica nas ruas de Gotham, hospitais sendo esvaziados, pacientes removidos, pessoas querendo invadir a emissora de TV para assassinar o delator, sendo que até um policial tenta matar este homem. Enquanto isso o Coringa faz uma visita a Harvey e com um discurso persuasivo e manipulador o criminoso de mente doentia se auto-intitula apenas um agente do caos e afirma que os verdadeiros responsáveis pela morte de Rachel tinham sido Gordon e Batman. O promotor ferido físico e emocionalmente, parece estar frágil e receptivo às palavras do palhaço. Harvey foge e o Coringa explode o hospital. Harvey, agora se auto-intitula o Duas Caras, inclusive fazendo o uso de uma moeda para decidir se realizará ou não seus atos de assassinato contra os envolvidos no sequestro e morte de Rachel, com cada pessoa respectiva, alguns são mortos por ele, outros salvos pela sorte do jogo de cara ou coroa. O agente do caos anuncia em rede de TV que tomará toda a cidade de Gotham ao cair da noite; a desordem e o pânico tomam conta dos cidadãos. Rodovias, barcos e balsas que conduzem pessoas em destino a saída da cidade, encontram-se lotadas e agoniadas. Em duas embarcações, o Coringa instalou duas bombas e deixou os controles que acionam as bombas em barcos distintos.                          

Em um barco no qual há somente presidiários está o controle da bomba do barco dos civis comuns. No outro barco, estão os civis comuns com o controle que aciona a bomba instalada no barco dos presidiários. O palhaço do crime faz um pronunciamento via auto-falantes simultaneamente para os dois barcos. Ele comunica a existência das bombas instaladas nos dois barcos, avisa que o controle que aciona a bomba do barco dos civis está no barco dos presidiários. E, que o controle que aciona a bomba no barco dos presidiários, está no barco dos civis. O agente do caos informa que o barco que optar em destruir o outro, estará a salvo.                                                              Caso nenhum dos barcos opte em destruir o outro até a meia noite daquele dia, ambos serão explodidos pelo Coringa. Logo surge o clima de tensão e indecisão nas duas embarcações, porém, os tripulantes dos dois barcos decidem por não acionar o controle que explodirá o outro. Batman, enquanto isso tenta localizar o paradeiro do palhaço do crime, através de uma tecnologia desenvolvida por Lucius Fox, que funciona como um sonar localizador. Para que a tarefa fosse possível, o homem morcego havia instalado os sonares em cada telefone celular presente em Gotham.                                    

Ação esta, que deixou Fox moralmente contrariado em relação à utilização e a serventia desta tecnologia. Batman, já prevendo que o cientista talvez se recuse a auxiliá-lo na busca pelo criminoso, pede que ao término da missão Fox digite seu nome. Desta forma, os controles dos sonares seriam destruídos, perdendo sua utilidade definitivamente. Com o auxílio do cientista, o homem morcego localiza o agente do caos, o impede de explodir os barcos e o mantém preso suspenso por um cabo para que a polícia possa levá-lo ao distrito policial. Coringa diz ao Batman que ele conseguiu pegar o cavaleiro branco, Harvey Dent, e rebaixou-o ao nível dele e do homem morcego. O herói não entende, o palhaço em tom triunfante diz para o cavaleiro das trevas esperar até ver quem se tornou Harvey Dent. Duas Caras está solto e buscando vingança contra Batman e Gordon, aqueles que ele acredita terem sido os grandes responsáveis pela morte de Rachel. O ex-promotor e agora assassino, rapta a mulher e o filho de Gordon. Batman é avisado pelo comissário e vai até o local onde estão Gordon, sua esposa, filho e o Duas Caras. O assassino começa seu jogo de cara ou coroa para decidir na sorte, quem irá morrer e quem sobreviverá.                                               

Gordon tem sorte, Batman não, recebe um tiro e aparentemente é abatido. Quando a sorte parece não estar ao lado do filho do comissário e este está prestes a receber um tiro, o herói se levanta e derruba Duas Caras de uma grande altura. O ex-promotor morre, Batman inicia um discurso responsabilizando-se pelas mortes e assassinatos. O homem morcego fala que quando se vive tempo demais como herói acaba por se tornar o vilão. E que assim sendo, ele Batman, tem a capacidade de ser as duas coisas, o herói e o vilão. Gordon se entristece com o que ouve, mas compreende que esta é a jornada do cavaleiro das trevas.

LEITURA ANALÍTICA
         Sob o ponto de vista da psicologia analítica, o filme retrata a difícil arte de se conciliar os opostos que há na psique dos indivíduos, a união da consciência com o inconsciente. Na jornada da individuação, temos de nos deparar com questões que, nas muitas vezes, acabamos por negar, reprimir ou protelar. Em boa parte das situações, as questões são relacionadas a um senso maniqueísta, sobre o certo e o errado. Em O Cavaleiro das Trevas, temos um exemplo de trágica dissolução da personalidade no caso de Harvey Dent e Duas Caras e um exemplo de sucesso da integração de conteúdos na consciência nos caso de Bruce Wayne e Batman. No exemplo de integração com sucesso, temos duas formas de ver a estrutura da psique uma com o ego sendo simbolizado por Bruce Wayne, a outra, como sendo Batman. Para a psicologia analítica, o ego é o sujeito da consciência.
 Entendo o´eu` como um complexo de representações que constitui para mim o centro de meu campo de consciência e que me parece ter grande continuidade e identidade consigo mesmo.
Por isso, falo também do complexo do eu.
O complexo do eu é tanto um conteúdo quanto uma condição da consciência (v.), pois um elemento psíquico me é consciente enquanto estiver relacionado com o complexo do eu.
Enquanto o eu for apenas o centro do meu campo consciente,,não é idêntico ao todo de minha psique,mas apenas um complexo entre outros complexos.
Por isso distingo entre eu e si - mesmo. O eu é o sujeito apenas de minha consciência, mas o si - mesmo é o sujeito do meu todo, também da psique inconsciente, dentro dele o eu. (JUNG, 1991, p.796, pág.406)


            No início da trama vemos Bruce Wayne dando pontos em feridas que foram geradas após uma noite de missão como Batman. O mordomo Alfred alerta seu patrão lhe dizendo que Bruce tem limites. O milionário responde dizendo que Batman não tem limites. Nesta fala, Wayne atribui qualidade de autonomia para o homem morcego, como se este fosse uma personalidade paralela e independente de si. Batman, neste contexto, simboliza a sombra de Bruce.
´Sombra`: A parte inferior da personalidade. Soma de todos os elementos psíquicos pessoais e coletivos que, incompatíveis com a forma de vida conscientemente escolhida, não foram vividos e se unem ao inconsciente, formando uma personalidade parcial, relativamente autônoma, com tendências opostas às do consciente. A sombra se comporta de maneira compensatória em relação à consciência. Sua ação pode ser tanto positiva como negativa. No sonho, a sombra tem frequentemente o mesmo sexo que o sonhador. Enquanto elemento do inconsciente pessoal, a sombra procede do eu: enquanto arquétipo do ´eterno antagonista, procede do inconsciente coletivo. A tarefa do início da análise é tornar a sombra consciente. Negligenciar e recalcar a sombra ou identificar o eu com ela pode determinar dissociações perigosas. Como ela é próxima do mundo dos instintos, é indispensável levá-la continuamente em consideração. C.G.Jung: ´A sombra personifica o que o indivíduo recusa conhecer ou admitir e que, no entanto, sempre se impõe a ele, direta ou indiretamente, tais como os traços inferiores do caráter ou outras tendências incompatíveis`.´A sombra é...aquela personalidade oculta, recalcada, frequentemente inferior e carregada de culpabilidade, cujas ramificações extremas remontam ao reino de nossos ancestrais animalescos, englobando também todo o aspecto histórico do inconsciente...Se, antes,era admitindo que a sombra humana representasse a fonte de todo o mal, agora é possível, olhando mais acuradamente, descobrir que o homem inconsciente, precisamente a sombra, não é composto apenas de tendências moralmente repreensíveis, mas também de um certo número de boas qualidades, instintos normais, reações apropriadas, percepções realistas, impulsos criadores, etc.`(JUNG, 2002, pág.359)

            Embora o ego possa sofrer com determinados conteúdos advindos da sombra, notamos ao longo do filme que Bruce não vive em função da sombra.As cenas do filme mostram que ele consegue conciliar a vida pessoal do milionário, boêmio e empresário com a vida de combate ao crime do cavaleiro das trevas. Uma boa parte da responsabilidade, na qualidade de vida que Bruce Wayne tem, se deve ao tipo de relação que sua consciência tem com a anima. A anima aparece simbolizada pela advogada Rachel Dawes.

Tal imagem é, no fundo, um conglomerado hereditário inconsciente, de origem remota, incrustada no sistema vivo, tipo de todas as impressões fornecidas pela mulher, sistema de adaptação psíquico herdado..., esta imagem é sempre projetada inconscientemente no ser amado; ela constitui uma das razões essenciais da atração passional e de seu contrário. ´A função natural do animus (como a da anima) consiste em estabelecer uma relação entre consciência individual e o inconsciente coletivo. ` ´A anima é o arquétipo da vida... pois a vida se apodera do homem através da anima, se bem que ele pense que a primeira lhe chegue através da razão (mind). Ele domina a vida com o entendimento, mas a vida vive nele através da anima. (JUNG, 2002, págs. 351, 352)

            A relação de Bruce com Rachel é marcada pelo paradoxo da proximidade e da distância. Ela o inspira a ter a vida que têm, sua condição de ser milionário empresário e homem morcego, acaba por criar afastamento e proximidade entre os dois dependendo do momento. Um importante fator é necessário para que a consciência consiga integrar os conteúdos inconscientes, a atividade do Self. Neste contexto, onde Bruce Wayne simboliza a consciência, Alfred simboliza o arquétipo do velho sábio, um símbolo do Self no inconsciente masculino.

 O Velho Sábio aparece nos sonhos como mago, médico, sacerdote, professor, catedrático, avô ou como qualquer pessoa que possua autoridade. O arquétipo do espírito sob a forma de pessoa humana, gnomo ou animal manifesta-se sempre em situações nas quais seriam necessárias intuição, compreensão, bom conselho, tomada de decisão, plano, etc; que no entanto não podem ser produzidos pela própria pessoa. O arquétipo compensa este estado espiritual de carência através de conteúdos que preenchem a falta. (JUNG, 2003, p.398, pág.213)
´ O si - mesmo é o centro e também a circunferência completa que compreende ao mesmo tempo o consciente e o inconsciente: é o centro dessa totalidade, como o eu é o centro da consciência.` ´O si - mesmo é também a meta da vida, pois é a expressão mais completa dessas combinações do destino que se chama: indivíduo.` (JUNG, 2002, pág.358)

            Alfred está sempre aconselhando e ou auxiliando Bruce em todos os aspectos, tanto os relacionados à Bruce Wayne o milionário como também as questões ligadas a Batman. O mordomo foi o tutor de Wayne durante sua infância e continua orientando-o na idade adulta. No primeiro exemplo de integração, como Bruce Wayne simbolizando o sujeito da consciência, temos a seguinte estrutura:

·         Bruce Wayne/ ego.
·         Batman/ sombra.
·         Rachel Dawes/ anima.
·         Alfred/ Self
.
            No segundo exemplo de individuação, sendo o ego simbolizado por Batman, os desafios se tornam maiores e o perigo de desintegração da personalidade, se torna uma ameaça muito próxima do cavaleiro das trevas. Agora, Bruce Wayne simboliza a persona de Batman.

 C.G.Jung: ´ A persona... é o sistema de adaptação ou a maneira por que se dá a comunicação com o mundo. Cada estado ou cada profissão, por exemplo, possui sua persona característica... O perigo está, no entanto, na identificação com a persona; o professor com seu manual, o tenor com sua voz... Pode se dizer, sem exagero, que a persona é aquilo que não é verdadeiramente, mas o que nós mesmos e os outros pensam que somos.`    (JUNG, 2002,pág.357)

            Bruce Wayne é o papel social de Batman, a forma como ele se mostra para todos e assim todos imaginam que ele seja desta maneira. Bruce é o milionário, empresário e chega até mesmo a impedir que o seu delator sofra um sério atentado, quando este sai com seu Lamborghini Murciélago pelas ruas de Gotham, em meio ao pânico da ameaça do Coringa de explodir um hospital. O Coringa simboliza a sombra de Batman.                        
O agente do caos não têm a natureza de uma sombra pessoal, e sim a de uma sombra arquetípica. Batman tem como objetivo trazer ordem para Gotham City, mas antes terá de se defrontar com seu adversário e sair de um estado de dissociação de si próprio.Tal destruição e violência contidos na imagem do palhaço do crime, são aspectos que precisam serem integrados na consciência a fim de fortalecimento do ego, e não de dissolução. Batman obtém êxito, ele consegue se apropriar das características presentes no Coringa para confrontá-lo. Ao instalar sonares nos celulares de Gotham, o cavaleiro das trevas, agiu sem escrúpulos, não se importou com regras e ou limites, tal como o próprio Coringa faria. A ajuda do Self é imprescindível na meta da individuação, desta vez o Velho Sábio, aparece simbolizado por Lucius Fox.                           
Sem a ajuda e ou tecnologia de Fox, Batman, não existiria. Foi o cientista quem lhe forneceu a armadura, o batmóvel e a ajuda na caça ao Coringa, operando na sala de sistema de controles dos sonares espalhados por Gotham. Ao admitir a responsabilidade das mortes, do civil inocente, da juíza, do comissário e de sua amada Rachel Dawes, Batman conscientizou-se de seu lado destrutivo e sombrio. O Cavaleiro das trevas consegue enxergar seu lado de senso de justiça e o destrutivo ao mesmo tempo. De acordo com tal contexto, temos a seguinte estrutura:

- Bruce Wayne / persona.
- Batman / ego.
- Rachel Dawes / anima.
- Coringa / sombra.
- Lucius Fox / Self
.
            Porém, nem sempre a integração de opostos é realizada com sucesso. O exemplo trágico é simbolizado por Harvey Dent. O cavaleiro branco como era chamado o promotor de justiça, também tinha o apelido de Duas Caras. Pois, sempre se utilizou de uma moeda em certos momentos, para tomar decisões. A morte de Rachel foi o evento no qual o ego do promotor se enfraqueceu. O fato é que a consciência de Harvey não pode suportar a pressão dos conteúdos do inconsciente e veio a sofrer com a dissolução de sua personalidade. O ego não teve forças o suficiente para suportar a integração da injustiça presente na sombra de um ego que só consegue se admitir como sendo o promotor de justiça. Harvey cinde com a realidade, consequentemente se torna psicótico. A desfiguração dê seu rosto simboliza a dissolução do seu ego de Harvey, efeito da psicose.

Antes do início da doença, existe atitude habitual da consciência que já não é apropriada. Mas existe também dificuldade em renovar a consciência, motivo pelo qual o novo fator que deve ocasionar a mudança assume a forma de complexo autônomo no inconsciente. O complexo atrai para si a energia psíquica, resultando na debilitação da consciência, com a conseqüente perda de energia e de confiança (abaissement du niveau psychologique, P. Janet). O enfraquecimento da consciência no abaissement permite que o complexo penetre na consciência. Como resultado, a antiga ordem é derrubada, e em seu lugar surge um distúrbio que clinicamente possui o caráter da psicose aguda. (FIERZ, 1997, pág.145)

            Quando observamos a dinâmica da psique do povo alemão diante do fenômeno do nazismo, podemos compreender de maneira bem clara, o funcionamento e ou irrupção da psicose na consciência. Com a derrota na primeira guerra, o enfraquecimento da consciência alemã, se tornou um terreno muito propício para a manifestação das forças compensatórias adormecidas do inconsciente. Situação semelhante ocorreu com Harvey Dent, após a morte de sua amada Rachel.
Quando essa espécie de movimento compensatório do inconsciente não consegue ser absorvido pela consciência individual, pode gerar uma neurose ou até uma psicose, e o mesmo vale para o coletivo. É evidente que para se produzir um movimento compensatório desse tipo é preciso que algo esteja fora de ordem na atitude consciente; algo deve estar invertido ou fora de proporções, pois somente uma consciência desequilibrada pode provocar um movimento contrário no inconsciente. (JUNG, 1990, p.448, pág.40)
            O cavaleiro branco sofreu a dissolução da consciência. Mas, quando a consciência consegue suportar a tremenda tensão da integração de opostos, surge a ordenação na psique. O cavaleiro das trevas alcançou a ordenação psíquica, fruto da integração dos conteúdos inconscientes. Embora tenha sido destruído, o bat-sinal projetado nos céus para chamar Batman é um símbolo desta ordenação, uma mandala, que expressa a totalidade.
Por outro lado, caso o indivíduo seja capaz de se agarrar a um último resto de consciência ou de preservar os vínculos de relacionamento humano pode surgir no inconsciente, justamente através da confusão do entendimento consciente, uma nova compensação que possivelmente será integrada pela consciência. Apareceriam novos símbolos de natureza coletiva que refletiriam agora forças de ordenamento.                           Medida, proporção e ordenamento simétrico encontram-se nesses símbolos em sua estrutura singularmente matemática e geométrica. Representam uma espécie de eixo e são conhecidos como mandalas. (JUNG, 1990, p.450, pág.41)

REFERÊNCIAS

FIERZ, Heinrich Karl, Psiquiatria Junguiana, São Paulo, Paulus, 1997.
JUNG, Carl Gustav, Aspectos do drama contemporâneo, Petrópolis, Vozes, 1990.
JUNG, Carl Gustav, Memórias, sonhos e reflexões, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 2002.
JUNG, Carl Gustav, Os arquétipos e o inconsciente coletivo, Petrópolis, Vozes, 2003.
JUNG, Carl Gustav, Tipos psicológicos, Petrópolis, Vozes, 1991.

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